domingo, 22 de novembro de 2020

Ofício

 




As sombras se estendem, longas, nas estradas,

e os ventos, em seu tropel, seguem seu curso,

desarranjando os arames dos cercados,

anuviando, pouco a pouco, todos os rastros:

cavalos, carros de boi, meninos, lagartos,

tudo vai se vestindo de um traje poento,

com aromas de guardado.

 

No alto do campanário,

um pombo arrulha as notas do dia,

e ao seu lado, solitário,

o crucifixo parece dizer tanto, calado...

Permaneço sobre o piso quente e ladrilhado

da pracinha defronte à igreja,

aguardando pelo sineiro –  é breve o ofício das seis.

 

Espero, espero, espero...

O sineiro, no entanto,

         não vem,

                   não vem,

                            não vem.

 

Dobram os silêncios no meu velho peito,

e eu compreeendo:

as palavras fugiram-me do alforje,

a poesia, porém, como o cordeiro,

deu-se-me, por inteiro.

Amém.




Kalliane Amorim

(Escrito em 14 de julho de 2020)

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