quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Acalanto

Quando a lua vem e acende
os sonhos da minha casa,
eu te ponho no meu colo,
na cadeira de balanço,
debaixo de minha asa.

E canto devagarinho
aquela cantiga doce,
como se de água e vento,
de orvalho e sentimento,
e de pólen ela fosse.

E vamos nos entendendo
tão bem dentro da canção,
que teus olhos já descansam,
sonhando alcançar a lua
com tuas pequenas mãos.

Se eu pudesse nessa hora
te dizer dessa ternura,
transbordando do meu corpo
sobre o teu, tão pequenino...
porém o instante não dura.

Então delicadamente
eu afago os teus cabelos,
temendo que te acordes,
e dissolva-se o momento
com um toque dos meus dedos.

É assim que acontece
quando a lua vem e acende
os sonhos da minha casa:
eu te guardo no meu colo
e descubro a eternidade
debaixo de minha asa.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Em 2013, eu nasci como mãe. Quem passa pela experiência, sabe bem o que é sentir um verdadeiro mistério acontecendo dentro de si, um mistério divino, que se dá no silêncio, na escuridão, numa longa espera, como são as coisas de Deus.
Em meio ao trabalho - à época, lecionava em outra cidade, Apodi, a setenta e poucos quilômetros de Mossoró -, presenteava-me com o prazer de acariciar longamente o barrigão dentro do qual meu menino crescia, cantava-lhe muitas músicas, conversava com ele, mostrando-lhe coisas bonitas o que o aguardavam nesse mundo. Eram instantes de uma intimidade e uma cumplicidade tão intensas, que, se ele estivesse agitado, logo se acalmava, muito embora eu amasse sentir aqueles chutezinhos.
Quando ele nasceu, a cumplicidade continuou. Bastava cantar uma musiquinha que tudo se amainava. As preferidas eram João e Maria (Chico Buarque), Onde estará o meu amor (Chico César), Assum preto (Luiz Gonzaga) e Mãezinha do céu. Mas uma que lhe chamava a atenção e, em vez de fazê-lo dormir, deixava-o com os olhos vidrados nos meus era The scientist (Coldplay).
Às vezes, revezávamos, eu e o pai, nas cantigas de ninar. Mas o pequeno, já um pouquinho maior, falando pelos cotovelos, dizia: "Papai, não canta! Quer mamãe!"
E rolávamos de rir com a sinceridade do nosso pitoquinho de gente.
Foi lembrando desses momentos que escrevi esse poema para meu filho, um poema que na verdade retrata o sentimento de qualquer pai ou mãe que se põe a cantar para o filho que adormece em seu colo. Há algo de sublime, algo que enleva e eleva o coração em observar uma criança a dormir em nossos braços.
Poderia o mundo estar em guerra, mas diante de uma criança que dorme, haveria que se baixar um decreto de silêncio e paz, pois nada há de mais importante para o homem que contemplar a si mesmo na simplicidade e na inocência da vida.

Excelente dia a todos!

Kalliane Amorim



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