segunda-feira, 6 de julho de 2020

Um pão e uma canção

Muita gente está aproveitando esses dias de reclusão em casa para colocar em prática seus dotes culinários. Aqui em casa não tem sido diferente. Embora não esteja cozinhando com tanta frequência, vez ou outra saem uns bolos, saladas, invencionices low carb, algumas vezes com a ajuda do meu pequeno masterchef. Mas quem vem reinando na cozinha, especialmente no preparo de pães, é minha cunhada Tatá (só para os íntimos), que têm preparado uns pãezinhos deliciosos. Da última fornada recebemos uma travessa cheia deles, foram as estrelas da janta e do café da manhã, acompanhados de ovos mexidos, queijo, patês e, claro, felicidade ao redor da mesa, que não há nada melhor que família reunida nas refeições.

Recebidos os pães, não sei por quê, me veio à mente, imediatamente, a canção Águas de Março, e olha que de março já passamos há quatro meses. Talvez tenham sido as chuvas, ainda persistentes, a causa desse pensamento. Talvez essa certeza de que, como as águas de março, todas as dificuldades passarão, e poderemos nos sentar à mesa, novamente, mas jamais como antes.

Tomando a inspiração dessa bela canção e dos pães deliciosos de minha cunhada, eis meu exercício de poema:

É a mão, é a enxada,
É a terra, é o grão,
É a chuva chegando,
É a propícia estação.

É a espera, é a fé,
É um estalo no chão,
É um estrondo no peito,
É o dourado pendão.

É a colheita no campo,
É o sol sobre o vagão,
É a palha esvoaçando,
É a água, é o grão.

É a peneira, é a moenda,
É a polia, é o pilão,
É a farinha faceira,
É a promessa do pão.

É a sova, é o suor,
É o descanso das mãos,
É o fermento, é o calor,
É o forno, é o fogão.

É a alma na massa,
É a clara comunhão,
É o aroma adentrando
O casebre e a mansão.

É o sim na madrugada,
É do sol o clarão,
É o café das três horas:
É o pão, é o pão!

É o trabalho, é a graça,
É o banquete, é a missão:
É a partilha da vida,
Numa só canção.

...

E assim vamos, no diálogo entre o pão e as Águas de março, aprendendo as lições da vida:


Dorme-te seca semente,
Acorda-te maduro grão,
Torna-te pão para as bocas
Dos muitos que a ti virão!


Kalliane Amorim



Ribeira

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